Depois das manifestações de 24 de Outubro e 11 de Novembro em Luanda, que foram marcadas pela violência da Polícia sobre os manifestantes, causando um morto e vários feridos, o Presidente da República de Angola saiu pessoalmente à rua com um extintor. Nós, cabindeses, tanto de dentro como da diáspora, aprendemos muito deste diálogo, que Sua Excelência, João Manuel Gonçalves Lourenço, manteve com os jovens de Luanda:
Por Afonso Justino Waco (*)
1º – É absolutamente de louvar a iniciativa do Presidente sair para acalmar os ânimos, num momento em que todos os angolanos estavam a resmungar pelo despeito sofrido pelos manifestantes devido à actuação brutal dos agentes da ordem pública sobre manifestações pacíficas. Sair vestido de bombeiro com um extintor na mão, consubstanciado pelo diálogo, foi acto de um governante fazendo prova de sabedoria e empatia. Não é para isso que se tem um Pai da Nação? Ou terá um bom pai de família uma maneira mais correcta de agir, que não seja aquela!
2º – Foi bastante educativa a aula cívica administrada pelo Presidente. Os jovens presentes e não só ouviram o que já sabiam, mas, desta vez, da voz mais autorizada do país: “A manifestação é um direito que assiste aos cidadãos, protegido pela própria Constituição. O que está proibido, por força das medidas impostas pelo estado de emergência, são os ajuntamentos públicos. Se a manifestação equivale a ajuntamento, esta não pode ter lugar”, disse para enfatizar. Uma inferência bem conseguida, deveras aceitável.
À luz desta afirmação, o Presidente estava a querer justificar o uso da violência por parte da Polícia. Dito de outra maneira, os agentes da Polícia só se comportaram de tal forma porque os cidadãos estavam a violar o estado de emergência; não por ter havido manifestações. Sobre este aspecto específico e embora não concordar ver a polícia se permitir maltratar pacatos cidadãos por qualquer motivo que fosse, sou obrigado a dar-lhe razão, pelo facto de termos acompanhado de longe manifestações gigantescas um pouco por todo lado em Angola no ano passado, sem que tivessem sido reprimidas pela Polícia de ordem pública. Mas em Cabinda qualquer manifestação é reprimida. Esta diferenciação de tratamento nunca mereceu qualquer explicação por parte dos detentores do poder.
3º – O Sr. Presidente não estaria a cometer nenhum erro se fizesse também chegar a Cabinda esta forma tão sábia de manifestar, muito bem explicada por palavras próprias e que prometeu levar para outros lugares do país, para pessoalmente e in loco dar alguns esclarecimentos a razão de aplicação naquele território da regra de dois pesos, duas medidas. É um direito da população daquele território saber por que é que nenhuma manifestação pode ter lugar em Cabinda, sem violência policial e detenções não justificadas, pouco importa se estamos a falar do período anterior à pandemia ou durante a mesma.
4º – O diálogo promovido pelo Presidente João Lourenço, e que escolhemos designar por extintor nas mãos do bombeiro, visa fundamentalmente extinguir o incêndio que por pouco ia consumir a casa. E não hesitamos, tão pouco, felicitar a boa iniciativa, pois é dever de quem se vê como pai da nação.
No entanto, a casa em Cabinda tem estado sob incêndio permanente há 45 anos. Não são apenas manifestações de jovens, mas por causa do conflito político que aquele povo tem com o governo angolano, conflito esse bem conhecido por todos angolanos e admitido pelas instituições angolanas.
Será que o Sr. Presidente pode vestir-se de BOMBEIRO, usando o mesmo extintor (o diálogo) para acabar igualmente com esse incêndio, que consome e asfixia tudo e todos naquele território?
O Alto Conselho de Cabinda (ACC), pela voz do seu porta-voz, apela, para que a mesma fórmula do DIÁLOGO inclusivo, que se tende aplicar para resolver os problemas do povo angolano em Angola, seja também extensiva para o problema de Cabinda. Do mesmo modo o ACC apela para que o responsável mais alto do executivo angolano ordene a libertação incondicional de todos os activistas que foram detidos e encarcerados em Cabinda por apenas exercerem o seu direito constitucional de manifestar. Se assim o fizer, estará pugnando pela justiça para todos, custe o que custar.
O povo de Cabinda e o mundo terão registado tal esforço nos anais da história.
Bem-haja a paz, Bem-haja a justiça.
(*) Pastor, Coordenador da Comissão para questões Políticas, Organização e Porta-voz do Alto Conselho de Cabinda